O Governo da República Popular da China anunciou oficialmente o perdão dos juros dos empréstimos concedidos a Moçambique até ao ano de 2024, além de uma doação financeira directa de 100 milhões de yuans: cerca de 12 milhões de euros ou 900 milhões de meticais.
A decisão foi tornada pública pela Primeira-Ministra moçambicana, Benvida Levi, após uma visita oficial a Pequim, onde manteve um encontro com o Presidente chinês Xi Jinping.
Segundo a governante, este apoio representa “um gesto de amizade e cooperação sólida entre dois povos irmãos”, reforçando as relações históricas entre Moçambique e a China, especialmente nos domínios de infra-estruturas, energia, agricultura e investimento público.
O peso da dívida com a China
A China é actualmente o maior credor bilateral de Moçambique, concentrando mais de 14 % da dívida externa total do país. De acordo com dados do Ministério da Economia e Finanças, em Março de 2025 a dívida moçambicana para com a China estava avaliada em 1,38 mil milhões de dólares, num total de 9,83 mil milhões de dólares de dívida externa global.
Historicamente, a China tem sido um dos principais países a conceder alívio financeiro a Moçambique. Entre 2001 e 2007, foram perdoados cerca de 52 milhões de dólares em diferentes renegociações. Em 2021, no âmbito das iniciativas de alívio da dívida para países africanos, Pequim cancelou 37,5 milhões de dólares adicionais em empréstimos livres de juros.
O que representa este perdão para Moçambique
O perdão dos juros e a doação equivalem a reduzir a pressão sobre o serviço da dívida pública, libertando espaço no orçamento nacional. Com cerca de 900 milhões de meticais adicionais disponíveis, o Estado poderá canalizar recursos para áreas prioritárias como educação, saúde, segurança alimentar e manutenção de infra-estruturas básicas.
Para efeito comparativo, 900 milhões de meticais seriam suficientes para:
- construir cerca de 25 escolas primárias completas em zonas rurais;
- equipar 10 hospitais distritais com novos serviços de maternidade e laboratórios;
- ou fornecer energia solar a 50 mil lares moçambicanos em áreas fora da rede nacional.
Num contexto de restrições financeiras, qualquer alívio na dívida traduz-se em maior capacidade de resposta orçamental. A economia moçambicana enfrenta actualmente desafios ligados ao aumento do custo da dívida, choques externos nos combustíveis e impactos climáticos recorrentes. O cancelamento dos juros reduz o peso das obrigações externas e liberta recursos para a gestão corrente do Estado, incluindo salários, serviços públicos e programas de investimento social.
Relação estratégica e diplomacia económica
O gesto da China é também um sinal político de confiança e de reforço da cooperação bilateral.
Além de ser um dos principais credores, a China é igualmente um dos maiores parceiros comerciais e investidores em Moçambique, com presença destacada nos sectores de energia, transportes, telecomunicações e construção.
Analistas de economia internacional classificam esta medida como exemplo de diplomacia financeira chinesa (“soft power”), uma ferramenta que combina ajuda económica e influência geoestratégica no continente africano. Apesar da importância do gesto, o perdão de juros e a doação de 100 milhões de yuans não alteram de forma substancial o volume total da dívida externa. O valor perdoado corresponde a menos de 1 % da dívida bilateral com a China, o que indica que o impacto é mais fiscal e diplomático do que estrutural. Contudo, o gesto poderá abrir espaço para novas negociações de reestruturação futura, especialmente em sectores de alto investimento público.
A decisão de Pequim é vista em Maputo como uma reafirmação de amizade e solidariedade histórica. Para Moçambique, representa um gesto de alívio e esperança num momento de desafios económicos e de necessidade de consolidação fiscal.
Mais do que o valor em si, o perdão simboliza um reconhecimento internacional do compromisso moçambicano com a estabilidade financeira e a boa governação.





