O antigo Procurador-Geral da República, Augusto Paulino, afirmou que a corrupção em Moçambique reflecte o estado moral e ético da própria sociedade, e que nenhuma lei, por mais severa que seja, poderá travá-la enquanto persistirem comportamentos e consciências tolerantes ao desvio de conduta. A intervenção ocorreu durante a Conferência Nacional sobre o Combate à Corrupção, realizada em Maputo, entre os dias 13 e 14 de Outubro.
“Falamos de corrupção, mas praticamos o contrário”
Com um discurso directo e introspectivo, Augusto Paulino questionou o comportamento dos cidadãos face à moralidade pública e à ética social: “De corrupção falamos todos. Mas quantos de nós pregamos: ‘façam o que eu digo e não o que eu faço’? A pergunta que fica é: como chegámos a este estágio?”
O ex-procurador alertou que o fenómeno se tornou transversal, afectando não apenas os dirigentes, mas também o tecido social. “Quando os grandes se corrompem, os pequenos seguem-nos”, disse, lamentando a banalização das práticas ilícitas e o exemplo negativo transmitido às gerações mais jovens.
Crítica à ostentação e desigualdade social
Paulino destacou o contraste entre a ostentação de alguns e a luta pela sobrevivência da maioria: “Quando vemos filhos de gestores públicos, que nunca trabalharam, esbanjar somas elevadas em restaurantes e circular em viaturas de luxo, enquanto jovens formados vendem amendoins para viver, e achamos isso normal, então estamos conversados.” Para o jurista, essa normalização da desigualdade e do privilégio cria um terreno fértil para a corrupção, tornando-a um comportamento socialmente aceitável.
Augusto Paulino insistiu que não é pela falta de leis que a corrupção prospera, mas sim pela ausência de valores e coerência. “Nenhuma lei será bastante enquanto as consciências forem contrárias. A existência de lei, só por si, não impede que as pessoas cometam crimes.”
O antigo procurador comparou o fenómeno à indisciplina nas estradas, observando que a lei existe, mas é a conduta humana que define o cumprimento ou a transgressão: “Não é pela existência do código de estrada que os automobilistas deixarão de conduzir embriagados ou em excesso de velocidade. Tudo depende da consciência do homem.”
A corrupção começa na consciência
Para Paulino, a verdadeira mudança no combate à corrupção deve começar na formação de carácter e na responsabilidade individual. Defendeu que as instituições de ensino, as famílias e as lideranças públicas têm um papel essencial na educação ética e cívica dos cidadãos. “A corrupção institucional começa na corrupção das consciências”, sublinhou.
Segundo o jurista, o combate à corrupção exige exemplo moral das lideranças, educação cívica sólida e valorização do mérito, factores que devem substituir o favoritismo e o compadrio.
O discurso de Augusto Paulino encerrou-se com um apelo colectivo à reflexão e à acção: “Falamos todos de corrupção, mas poucos a combatem com o próprio exemplo. A mudança começa dentro de cada um de nós.”
A mensagem ecoou entre os participantes da conferência como um alerta para a urgência de reconstruir valores éticos e morais nas instituições e na vida pública moçambicana.





